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Quimiometria,
um
microscópio virtual
LUIZ
SUGIMOTO
A
imagem do laboratorista que agita o tubo de ensaio para misturar reagentes
e analisar a solução colorida ou o precipitado que é
formado vem se diluindo ultimamente, à mesma medida que a quimiometria
comprova sua eficácia na análise de amostras químicas.
"Com a instrumentação disponível hoje, colocamos uma
série de amostras no equipamento e obtemos por intermédio
dos espectros, cromatogramas, etc, uma enorme quantidade de dados. Com
o "microscópio" da quimiometria, podemos extrair desta massa de
informações químicas aquelas que nos interessam e
na forma em que poderão ser úteis", afirma a professora Márcia
Miguel Castro Ferreira, do Instituto de Química (IQ) da Unicamp.
Química
quântica era a especialidade de Márcia Ferreira até
1995, quando ela sentiu necessidade de realizar um trabalho que tivesse
aplicações mais imediatas. Nada mais prático, pois
a quimiometria é uma técnica cada vez mais requisitada por
setores produtivos e por outras áreas do conhecimento. Uma tese,
envolvendo a tangerina murcote e a utilização do óleo
de soja epoxidado como aditivo na fabricação de filmes de
PVC, serviu de mote para esta reportagem. Isto até se perceber que
fruto e óleo eram apenas dois exemplos da versatilidade de uma técnica
ainda pouco difundida no Brasil, mas que fatalmente se tornará básica,
inclusive na grade curricular dos estudantes de química.
"No
caso da murcote, o objetivo foi estudar um tratamento alternativo para
o desverdecimento artificial da tangerina. É uma fruta de exportação
sujeita a muitas variáveis, como transporte em navio e temperatura
de armazenamento até chegar à prateleira de outro país,
e durante este percurso deve manter características de doçura
e cor. A análise quimiométrica leva em conta essas variáveis
e pode extrair informações relevantes, tais como a temperatura
apropriada para estocagem e concentração adequada do produto
químico utilizado no desverdecimento", explica a pesquisadora.
A
outra parte da tese avalia a qualidade do óleo de soja epoxidado
usado como plastificante e estabilizante térmico na composição
da matéria-prima de filmes de PVC. Com a exposição,
os filmes podem perder a coloração, exigindo o óleo
como aditivo contra a deterioração. "No controle industrial,
normalmente se retira uma amostra de tempos em tempos do processo, a fim
de verificar em laboratório a qualidade de óleo de soja epoxidado.
A idéia é substituir grande parte da análise via úmida,
por equipamentos de espectroscopia, economizando tempo, pessoal e gastos
com reagentes. Será necessário, então, recorrer à
quimiometria para dosar o grau de epoxidação do óleo
e outros produtos", afirma.
Fármacos
- A técnica tem uma aplicação importante também
na farmacologia, quando é preciso relacionar a estrutura de um composto
com sua atividade biológica. "Ao invés de sintetizar compostos
em laboratório para então medir esta atividade, a análise
quimiométrica permite selecionar apenas aqueles potencialmente ativos
e descartar os demais, eliminando uma exaustiva fase de experimentos. Fizemos
um trabalho desta natureza com derivados de artemisinina, que são
antimaláricos, e o CPQBA está sintetizando um dos compostos
que indicamos como bioativo".
Outras
áreas também podem estar se beneficiando com a quimiometria.
"Foi possível, por exemplo, discriminar diversos tipos de embutidos
de peru, com base nos teores de minerais, e também a determinação
simultânea dos teores de cafeína, trigonelina, proteína
e açúcar em grãos de café usando espectroscopia.
Outro trabalho recente na linha de alimentos foi feito com um grupo da
USP de São Carlos, para detectar e dosar a adição
de caramelo em destilados alcoólicos e também avaliar o envelhecimento
do produto", acrescenta a professora.
Pioneira
- A quimiometria surgiu há pouco mais de 20 anos e já
faz parte do currículo de graduação e de pós-graduação
no exterior. No Brasil, a Unicamp foi uma das pioneiras na introdução
da disciplina. Márcia Ferreira especializou-se em análise
de dados (a outra área é de planejamento e otimização
de experimentos) e oferece a disciplina uma vez por ano no Instituto de
Química. "A média é de 30 alunos de pós", festeja
a professora, que também já ministrou este curso e minicursos
desta área na USP de São Carlos, UFSCar, Federal de Santa
Catarina e outras instituições do país e no exterior.
"A universidade que não introduzir a quimiometria na sua grade,
já está perdendo terreno", adverte Márcia Ferreira.
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